Mesmo que aprovada no Congresso, anistia do 8 de Janeiro pode ser barrada pelo STF por inconstitucionalidade, dizem ministros
Mesmo com o avanço da proposta de anistia aos manifestantes do 8 de Janeiro no Congresso Nacional, ministros do Supremo Tribunal Federal já admitem, nos bastidores, que a Corte poderá barrar a medida caso seja aprovada.
O argumento apontado por membros do STF, em conversas reservadas com a imprensa, é o de possível inconstitucionalidade do projeto, sob a justificativa de que os crimes associados aos protestos não poderiam ser perdoados — uma interpretação que, segundo defensores da proposta, ultrapassa os limites da imparcialidade jurídica e interfere diretamente na soberania do Parlamento.
A proposta de anistia, capitaneada por deputados ligados à direita e com forte apoio popular, já conta com mais de 240 assinaturas na Câmara e se aproxima das 257 necessárias para ir diretamente ao plenário. A medida busca reparar o que seus defensores consideram um desequilíbrio nas punições impostas, muitas delas com base em tipificações controversas e penas severas, como associação criminosa armada e crimes contra o Estado de Direito — mesmo para pessoas que não participaram de atos violentos.
Para os apoiadores da anistia, a iniciativa representa não apenas um gesto de pacificação, mas também um contraponto necessário ao que veem como excessos judiciais e perseguição política. “Não se trata de passar pano para vandalismo, mas de reconhecer que há brasileiros presos há mais de um ano sem julgamento justo, muitos deles idosos e sem antecedentes, tratados como criminosos perigosos por estarem em Brasília naquele dia”, afirma um parlamentar que integra a articulação do projeto.
O STF, por sua vez, já deu sinais de que pode declarar a lei inconstitucional, amparando-se no artigo 5º da Constituição, que proíbe anistia em casos como terrorismo ou atentado contra o Estado democrático. Mas juristas e parlamentares apontam que classificar os atos do 8 de Janeiro como terrorismo é uma interpretação elástica e politizada, usada para justificar punições desproporcionais.
A movimentação no Congresso reflete também uma insatisfação crescente com a atuação do Judiciário em casos que envolvem o campo político, especialmente após condenações em série com base em entendimentos controversos da Lei 14.197/2021. A leitura entre congressistas é que o Parlamento tem o direito — e o dever — de legislar sobre o tema, inclusive para corrigir eventuais distorções jurídicas.
A expectativa é de que, mesmo diante de eventual judicialização, o tema chegue ao STF com o peso simbólico e político de uma decisão parlamentar soberana, impulsionada por milhares de vozes nas ruas e nas redes. Se o Supremo decidir reverter a anistia aprovada pelo Congresso, o gesto será lido como mais um capítulo da crise entre os Poderes — e poderá acirrar ainda mais o debate público sobre liberdade, justiça e equilíbrio institucional no país.