Lula sela aliança com China, desafia Trump e flerta com riscos diplomáticos
“Não temos medo de retaliação”, disse o mandatário
Em sua investida internacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva consolidou em Pequim uma aproximação inédita com a China que, na prática, se traduz numa aliança política e estratégica que parece ignorar os custos diplomáticos com os Estados Unidos.
“Não temos medo de retaliação”, disse Lula, ao ser questionado sobre a possibilidade de reações do ex-presidente americano Donald Trump, uma figura com influência ainda latente no cenário global.
O encontro com Xi Jinping, carregado de simbolismos e declarações afinadas, foi mais do que uma visita de Estado: representou a escolha clara de um lado em um mundo cada vez mais polarizado. “A relação entre o Brasil e a China nunca foi tão necessária”, afirmou Lula, durante os compromissos oficiais no Grande Salão do Povo. O tom foi de convergência total, com ambos os líderes utilizando termos idênticos para criticar a ordem internacional vigente. “Guerra comercial não tem vencedores”, repetiram, quase em coro.
Xi foi ainda mais direto ao afirmar que o Sul Global deve resistir às pressões externas. E Lula, longe de buscar equilíbrio, optou por reforçar a retórica: “Não queremos chefe, não queremos xerife, queremos parceiro”, disse, em alusão clara à postura intervencionista de Washington. Não bastasse, chamou Trump de alguém que age como se fosse “dono do mundo”.
A visita gerou resultados comerciais estimados em R$ 27 bilhões, incluindo acordos em energia, transporte, biotecnologia e até uma nova montadora em Goiás. Mas, como de praxe, boa parte das promessas segue sem cronograma definido, o que torna difícil mensurar o impacto real da aproximação sino-brasileira no curto prazo.
Mais polêmica ainda foi a proposta, feita por Lula e aceita por Xi, de enviar ao Brasil um especialista chinês para discutir regulação de redes sociais. Vinda de um país que pratica censura sistemática e bloqueia plataformas ocidentais, a iniciativa levantou dúvidas sobre os critérios do governo brasileiro ao buscar “inspiração” para lidar com o debate digital.
O entusiasmo do Planalto com a parceria, no entanto, contrasta com a falta de avanços em áreas cruciais, como a adesão à Nova Rota da Seda, evitada por temores sobre soberania. Projetos como a ferrovia bioceânica continuam empacados, apesar da retórica de “sinergia” entre os países.
Ao fim, a viagem expôs uma política externa movida mais por ideologia e antagonismo do que por equilíbrio estratégico. Lula quer mostrar que tem amigos poderosos — mesmo que isso signifique esticar a corda com parceiros históricos como os EUA. A dúvida é se o Brasil, com sua economia vulnerável e papel periférico, pode bancar essa ousadia sem consequências.