Judiciário

Flávio Dino propõe responsabilização direta de plataformas e amplia exceções ao Marco Civil da Internet

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino defendeu nesta terça-feira (11) a responsabilização direta de plataformas digitais por conteúdos publicados por terceiros, mesmo sem ordem judicial. O voto, apresentado no julgamento sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet, propõe um novo modelo de regulação com forte impacto sobre a liberdade de expressão no país.

Na prática, Dino propôs tornar as plataformas corresponsáveis por conteúdos considerados “manifestamente ilícitos”, incluindo publicações que façam “apologia ou instigação à violência contra o Estado Democrático de Direito” — uma definição vaga que, segundo juristas, pode abrir caminho para a remoção de críticas políticas legítimas.

O artigo 19 do Marco Civil estabelece que empresas só podem ser responsabilizadas judicialmente se ignorarem decisão de remoção. Dino considera esse modelo insuficiente e sugere que a responsabilização ocorra de forma preventiva, transferindo às plataformas o dever de agir como censores privados sob supervisão estatal.

Entre os novos deveres sugeridos estão a identificação de perfis falsos ou automatizados — que, segundo o ministro, violam a vedação constitucional ao anonimato — e a remoção imediata de conteúdos pagos ou patrocinados considerados ilegais, com base no argumento de que o lucro retira a proteção jurídica do conteúdo.

O voto de Dino inclui ainda a possibilidade de retirada de conteúdos sem ordem judicial nos seguintes casos: crimes contra crianças e adolescentes; incentivo ao suicídio ou automutilação; terrorismo; e conteúdos que instiguem crimes contra o Estado Democrático de Direito. Em tese, esse último ponto poderia englobar críticas, protestos ou denúncias incômodas ao governo.

Além disso, o ministro propôs a criação da figura da “falha sistêmica” — um conceito abstrato que permitiria punir plataformas por tolerância reiterada a conteúdos considerados ilegais. Segundo ele, não seria necessário comprovar dolo ou má-fé, apenas a existência de um padrão de inação.

Dino defendeu também a imposição de um sistema de “autorregulação obrigatória” para as plataformas, com notificações extrajudiciais, relatórios periódicos e um modelo de responsabilização supervisionado diretamente pela Procuradoria-Geral da República (PGR), enquanto o Congresso não aprova legislação específica. A proposta foi criticada por outros ministros por transferir poderes regulatórios à PGR sem amparo legal.

O voto acompanha parcialmente os de ministros como Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso, que também se mostram favoráveis à flexibilização do artigo 19. Apenas André Mendonça, até agora, votou pela manutenção integral da regra atual.

Especialistas alertam para o risco de criação de uma “censura preventiva disfarçada”, na qual empresas privadas, temendo sanções, optem por remover conteúdos lícitos para evitar qualquer risco. A medida ampliaria a influência do Judiciário sobre o espaço público digital sem mediação legislativa, em um cenário de insegurança jurídica e política para quem expressa opiniões contrárias ao governo ou ao establishment institucional.